Estou neste mercado de distribuição há quase 25 anos, criando redes, gerenciando redes, resolvendo problemas de parceiros e ajudando-os a prosperar ou até mesmo sendo o mensageiro de notícias ruins. Mas entre entregá-las e deixar o parceiro descobrir sozinho, prefiro ser eu mesmo a falar: “Amigo, deu zebra.”
Há algum tempo, chamávamos isso tudo de cadeia de valor, e era bem definido o papel de cada um: fabricante tem que fabricar, distribuidor tem que distribuir e revendedor tem que vender. Isso funcionou por muito tempo até que perguntas começaram a ser feitas:
- “Se eu fabrico, por que não posso distribuir e vender?”
- “Se eu distribuo, por que não posso fabricar e vender?”
- “Se eu vendo, por que não posso distribuir e vender?”
Ou seja, tudo junto e misturado. E tudo isso agora chamamos de ecossistema, ao qual se agregaram novas camadas: indicadores, influenciadores e outros atores que também são remunerados. O resultado? A margem de todo mundo se espremendo. O que antes era cadeia de valor agora é uma cadeia de preço, onde ninguém mais reconhece o valor de nada, todo mundo é preço.
O desafio dos distribuidores e fabricantes
Não é comum ver um distribuidor falar que recebe todo dia um pedido para melhorar o preço para determinados revendedores. E ele tem que fazer porque tal revendedor representa quase 30% das suas vendas. Ou da mesma forma, o fabricante dizer que não está aguentando e precisa achar um jeito de ir direto para o cliente final e desintermediar seu acesso ao comprador, minha margem só cai e fica pelo caminho na distribuição.
Daí a turma pergunta, o canal nunca esteve tão bagunçado, e agora, o que fazer?
Não quero entrar a fundo aqui, mas farei isso em outras oportunidades, pois depois de anos trabalhando em distribuição de quase tudo, seja como executivo, CEO, conselheiro ou empreendedor, desde alimentos até software, percebi uma coisa em comum em todas as indústrias: o canal não entra em colapso de fora para dentro, mas sim de dentro para fora. O papel do fabricante nunca foi tão pesado. Ele precisa manter a mesma qualidade, dar suporte à distribuição, entender novos canais e ainda ouvir que sua competitividade está em risco, que pode ser trocado a qualquer momento.
O papel do distribuidor igualmente, ter que distribuir, manter suporte, criar operação de retaguarda comercial ativa e de manutenção e ainda escutar que seu revendedor precisa melhorar o preço e ajudá-lo a vender mais. Já o revendedor nunca foi tão assediado com propostas mirabolantes e vendo o preço baixar todo dia e ter que vender mais.
A concorrência desleal e o que fazer
Realidade seja dita agora, tudo isso levou a uma concorrência do pior tipo, onde o fabricante finge que fala, o distribuidor finge que acredita e o revendedor finge que está engajado até receber uma proposta melhor de outro.
Mas tudo bem, Michel. Eu entendi tudo isso, já sabia, estou sentindo no bolso e o que fazer?
Bom, vou te dizer que há muito a se fazer, mas precisa ser feito agora. Há um tempo atrás, quando os fabricantes e distribuidores tinham um programa de canais atrelado a deveres e benefícios, funcionava, ou seja, se o parceiro cumprisse algumas metas comerciais e operacionais, você melhorava as condições dele. Mas tudo mudou desde o ponto que ele, com a mesma produção sem ter que cumprir meta, recebe uma condição melhor da concorrência.
Então os programas precisam ser atualizados e reescritos por pessoas que estão vivendo essa bagunça toda. De toda forma, escrevo aqui algumas coisas que estão ajudando meus sócios e clientes, que têm dado muito certo. Até deixar de dar, lembre-se de que nada é para sempre, esta é a vocação do empreendedor, resolver problemas o tempo todo, o empreendedor que não tem sede de resolver problemas morre desidratado pela concorrência que esta com sede de resolver e mata ele de sede.
Notem que falamos que o papel de cada ator do ecossistema mudou, então você precisa mudar também, e pare para pensar que eu nem falei ainda de inteligência artificial, mas vou focar aqui em dar algumas dicas que podem te ajudar e que você deveria estar fazendo desde ontem.
A importância da comunicação no canal
A atitude principal do gestor de canal hoje é nada mais nada menos que manter o canal de comunicação aberto. Fazer uma desintermediação da informação, deixar o canal sempre à vontade para falar com você, ou seja, não precisa tirar o responsável do canal da frente, mas tenha certeza de que o seu gestor te reporta verdadeiramente o que o canal está sentindo.
Já passei por situações onde o canal disse que precisava melhorar o preço para concorrer a uma oportunidade, mas seria só para essa, e o gestor reportou que o canal estava pressionando ele para melhorar o preço. Quando olhei a produção do canal e o preço que ele queria, fiquei chateado e liguei irritado para ele, depois de falar o que pensava. E ele respondeu, “Te passaram que é só para esta oportunidade? Meu preço continuará o mesmo”. Aí, pedi desculpas e retornei à minha ineficiente comunicação interna com toda energia para corrigir, nunca mais erro ali.
Eduque seu canal de vendas
Entenda que o canal sabe muito sobre seu produto, mas talvez não saiba nada sobre empreender. As boas práticas de gestão, governança e planejamento, coisas que te levaram até onde você está hoje, não critique nunca uma pergunta que pode parecer idiota do parceiro, mas sim tente ensiná-lo. Mostre como você fez, faça um playbook, ou como falamos no interior, um mapa da mina, para que ele nunca se sinta perdido, chegue no detalhe de ensinar o que ele precisa fazer na segunda, na terça, o que precisa ser feito de manhã, de tarde, mostre para ele que você fez isso e deu certo e que nunca foi preço, e sim gestão.
Crie uma área de educação do canal se não tiver gente para fazer, faça você mesmo, mas não deixe que o concorrente treine seu parceiro, pode ser que ele não volte.
Planejamento deve ser feito em conjunto
E indo para o final aqui deste texto que já está ficando grande. Sempre ajude seu parceiro a planejar antes de definir seu próprio planejamento anual ou mensal. Todo mundo deveria fazer isso! Como esperar um crescimento de 20% sem combinar com o parceiro? Muitas vezes, vi gestores ligando para seus parceiros e dizendo: “Preciso que você cresça 20%, conto com você, o que você precisa?” Kkkk.
Faça diferente! Nunca antes o canal deu tanta atenção pra aprender outras habilidades que não só sobre produto. Chegue para o parceiro e atue como um consultor do Sebrae quase, um plano de 10 páginas simples para ele ter visibilidade
– O que fazer?
– Como fazer?
– Com quem fazer?
– Quanto investir?
– Quais são as oportunidades do mercado e suas ameaças?
Mostre a ele como fazer um time de vendas parecido com o que você tem hoje dentro da realidade dele. Dá muito trabalho, eu sei, por isso que você precisa começar a fazer, fazer com os primeiros depois vira um processo.
Nunca tire seu parceiro da mesa
E agora eu prometo que é o último. Nunca tire seu parceiro da mesa, sempre crie condições para ele continuar, porque no fim do dia, você pode usar seu CAC para melhorar muita coisa.
Acredite, independentemente de como for, quem descobrir o canal mais eficiente primeiro, vence. A concorrência pode até copiar ou melhorar, mas se lembre: o canal de hoje pode ser seu fornecedor no futuro.
Quem tem o canal vence!
Fuii.